Quando se analisa o comportamento dos preços dos combustíveis no Brasil, o que surpreende é a ausência de políticas públicas permanentes que evitem as altas sucessivas ou variações bruscas do preço de insumos básicos, com alto impacto econômico, como por exemplo o óleo diesel. Além de afetar drasticamente o transporte de pessoas e cargas, reajustes do diesel determinados simplesmente pela alta dos preços internacionais ou pela variação cambial impedem aos operadores de transporte manter o equilíbrio econômico-financeiro dos serviços prestados ou mesmo planejar as operações de forma ordenada.

Para se ter uma ideia, os recentes aumentos acumulados do diesel oneraram a planilha de custos das operadoras de transporte público coletivo urbano por ônibus em 5,8%, tendo em vista que o combustível representa, em média, 23,7% dos custos operacionais das empresas. 

Aumentos sucessivos, em intervalos curtos, têm efeito devastador nas contas de setores regulados, como o transporte público, que não podem simplesmente repassar os aumentos de seus insumos. Suas tarifas, muitas vezes definidas politicamente pelo poder concedente local, são atualizadas, se tanto, uma vez ao ano, sendo que, em muitas cidades, tais reajustes previstos em contrato às vezes ficam pendentes por dois anos ou mais. Não há como fazer a conta fechar.

Na outra ponta dessa cadeia está o passageiro de baixa renda, aquele que utiliza o transporte para se locomover ao trabalho e realizar outras atividades necessárias como ir à escola, a consultas médicas e outras. É dele, que não dispõe de outras opções, a parcela mais dura dessas oscilações de preços quando finalmente chegam às tarifas. Segundo dados da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP), a variação acumulada no preço do óleo diesel nas distribuidoras nos últimos 12 meses foi de 17,1,%, o que implica impacto de 4,1 % no preço médio das passagens do ônibus coletivo urbano, o equivalente a mais R$ 0,16 na tarifa média nacional.

Nada contra a regra de preços adotada pela Petrobras, se tal regra viesse acompanhada por políticas públicas que utilizassem mecanismos reguladores que evitassem oscilações repentinas e desmedidas. Existem instrumentos para isso, adotados em vários países, como fundos reguladores que aproveitam momentos de preços favoráveis para acumular recursos que possam mitigar os picos das variações de preços internacionais. O Brasil já tem seus mecanismos, como a Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (CIDE), mas prefere não utilizá-los para equalizar as flutuações excessivas de preço dos combustíveis.

Para agravar a situação, a falta de políticas públicas efetivas para a mobilidade urbana nos direcionam na contramão das tendências mundiais, ao incentivar o transporte privado, que congestiona as cidades, polui mais e causa mais acidentes, ao invés de priorizar o transporte coletivo. Essa é a conclusão quando analisamos o tratamento desigual dado ao diesel, que move o ônibus, frente à gasolina, que move carros e motos.

Segundo levantamento da Associação Nacional das Empresas de Transportes Urbanos (NTU), com dados publicados até dezembro de 2020 pelo IBGE, o preço do diesel sofreu um aumento de 202,37% superior ao preço da gasolina e 248,26% maior que o IPCA nos últimos 21 anos, o que resultou num peso acumulado de 511,12% para o transporte público, muito maior que os 308,75% de impacto para o transporte individual.

O combalido cenário econômico brasileiro pede soluções definitivas para problemas crônicos, que afetam pequenas e grandes empresas, além de investidores. Os serviços essenciais estão nesse rol.

No caso específico do transporte público, uma lista de sugestões de entidades do setor está à disposição dos tomadores de decisão. As soluções passam pela criação de um fundo que ajude a custear o transporte público e a reformulação da estrutura tributária que incide sobre o diesel. Outra possibilidade é a redução do preço do diesel mediante a diminuição do nível de biodiesel misturado a esse insumo, sem causar alterações nas emissões de poluentes. O percentual da mistura de biodiesel no diesel utilizada no Brasil, de 13%, é superior ao que vem sendo praticado na Europa (7%), Japão (5%) e Canadá (2% a 4%), para citar alguns exemplos.

Entidades ligadas ao transporte público e especialistas no assunto defendem ainda a adoção de um novo marco legal para o transporte público urbano e de caráter urbano, que inclua a segurança jurídica e a transparência nas relações contratuais. Dessa forma, entendem que questões como a do diesel e outras tantas que emperram a roda do crescimento desse setor sejam contempladas de forma coerente, organizada e eficiente, favorecendo a todos os elos dessa cadeia produtiva. E para que possa, enfim, ser reduzido o fardo que recai sobre quem usa o serviço.

Por Otávio Cunha, presidente executivo da NTU – Associação Nacional das Empresas de Transportes Urbanos